GESTÃO DAS PRAIAS.
O QUE FOI DITO QUE SERIA MAS NÃO FOI.
É realmente impressionante a constatação do que o Governo diz que vai fazer e o que na verdade faz. A transferência da Gestão das Praias para as Prefeituras litorâneas é o exemplo mais recente e desolador. Há décadas se discute e se debate o tema. A oportunidade de se transferir para as Prefeituras o imenso litoral Brasileiro, de vez que a União pouca coisa fez e faz, a não ser arrecadar as taxas de ocupação e os laudêmios, incidentes sobre os chamados terrenos de marinha e seus acrescidos, sempre foi um tema recorrente. O Governo do Temer não fugiu à regra. Durante meses alardeou que chegara o momento de a União transferir para as Prefeituras, a Gestão das Praias. Estudando a Lei nº 13.240, de 30 de Dezembro de 2015, alterada pela Lei nº 13.465, de 11 de Julho de 2017, o que se verifica é o contumaz “deixa que eu chuto, chuta que eu deixo”, ou seja, a titubeante determinação de dizer que vai fazer e não faz, ficando o “dito pelo não dito”, complicando ainda mais o caos e a insegurança jurídica que existe nesse importante e delicado espaço geográfico. Todo mundo sabe que a União não tem capacidade técnica de gerir o imenso patrimônio fundiário que representa e é constituído pelos terrenos de marinha, seus acrescidos, a faixa de praia e as áreas de segurança, abrangidos pelo imenso litoral brasileiro. Há mais de 30 anos que a União não faz seu dever de casa: demarcar e delimitar as LPM’S do litoral brasileiro, extremando o que é público do que é particular, registrando em seu nome as áreas de sua indiscutível propriedade, a fim de que de que possa agir, nessas áreas, como se fosse um particular qualquer; vendendo, arrendando, retomando as porções indevidamente ocupadas e dando uma destinação econômica plausível, capaz de justificar a imensa máquina burocrática montada para gerir o que muitos acham ser a maior imobiliária do mundo. A Medida Provisória nº 759 foi convertida, transformando-se na Lei nº 13.240/2015 que, por sua vez, foi alterada pela Lei nº 13.465/2017, que estabeleceria a Gestão das Praias, pelas Prefeituras; logo de início, ao baixar a regulamentação, através da Portaria 133, de 12 de Julho de 2017, a SPU, estabeleceu na Cláusula Quinta- Da Ocupação por Terceiros- que: § 1º “ Em nenhuma hipótese o Município poderá transferir a terceiros direitos reais ou demais direitos deles decorrentes em relação as áreas de que trata este Termo de Adesão”. Ora, as áreas de que trata o Termo de Adesão, são exatamente as praias, que seriam geridas e administradas pelas Prefeituras. Mais ainda: excluiu as áreas consideradas de segurança para a defesa nacional (30 metros a partir do final das praias, nos termos da Lei 7661/1988 e do seu regulamento, baixado com o Decreto 5.300/2004). O artigo 10 da 7661, que estabeleceu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, diz que as praias são as áreas cobertas e descobertas periodicamente pelas águas, acrescidas das faixas de material detrítico, tais como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação, ou na sua ausência onde comece um outro ecossistema. A Zona Costeira brasileira, considerada patrimônio nacional pela Constituição de 1988, corresponde ao espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e uma faixa terrestre. A faixa marítima corresponde ao nosso mar territorial na sua totalidade, medido a partir das linhas de base, ou seja, da demarcação da Linha do Preamar Médio de 1831. A orla marítima é a faixa contida na zona costeira, de largura variável, compreendendo uma porção marítima e outra terrestre, caracterizada pela interface entre a terra e o mar. O limite terrestre da orla marítima foi estabelecido em 50 metros para áreas urbanizadas e 200 metros para áreas não urbanizadas, demarcados na direção do continente a partir da linha de preamar ou do limite final de ecossistemas, tais como as caracterizadas por feições de praias, dunas, áreas de escarpas, falésias, costões rochosos, restingas, manguezais, marismas, lagunas, estuários, canais ou braços de mar, quando existentes, onde estão situados os terrenos de marinha e seus acrescidos(artigo 23,II, do Decreto nº 5.300/2004, que regulamentou a lei 7661/1988, que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro). O Estado do Ceará tem sua Lei de Gerenciamento Costeiro e o Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro. Ela se complementa e se integra com a Lei Nacional de Gerenciamento Costeiro. Dentro desse princípio federativo, o Estado do Ceará estabeleceu que sua zona costeira e, portanto, sua orla marítima, tem 18 micros ecossistemas. Nem tudo o que se encontra na orla marítima do imenso litoral Cearense, de sua zona costeira, é praia e áreas de segurança. Esses micros ecossistemas tem que estar definidos e delimitados, dentro de sua orla marítima, que é apurada a partir da demarcação da Linha de Preamar Médio de 1831: 50 metros para áreas urbanizadas e 200 metros para áreas não urbanizadas. Feita a demarcação da LPM como é comumente chamada e apurados os terrenos de marinha (33 metros em direção do continente) delimita-se os 50 metros caso as áreas já estejam urbanizadas e os 200 se ainda não se encontram urbanizadas, tudo em direção ao continente. O resultado é a caracterização e definição da orla marítima daquele município. Dentro desse espaço pode existir uma faixa de praia e em seguimento a ela um dos 18 micros ecossistemas previstos pela legislação Estadual, tais como falésias vivas ou mortas, dunas fixas e móveis, tabuleiros pré-litorâneos, planícies de deflação, paleodunas, Bermas, e também os 30 metros das áreas de segurança. A partir de 1998, com base na legislação federal sobre a administração dos bens imóveis da União, ficou obrigatório o registro destes bens no Cartório de Registro de Imóveis. Assim, depois de concluídos os processos de identificação e demarcação das terras da União, a Secretaria do Patrimônio da União deverá lavrar internamente, em livro próprio, a escritura pública, além de registrar no Cartório de Registro de Imóveis competente o termo que atribuiu a propriedade à União. A União tem, obrigatoriamente, que demarcar a LPM-1831, do litoral Cearense, para só então definir o que é faixa de praia, os terrenos de marinha e as áreas de segurança. Sem a demarcação da LPM, ninguém em sã consciência pode fazer nada nesse espaço geográfico. Muito menos transferir a gestão desse espaço para a Prefeitura. O que foi feito, tal como está colocado, a União transferiu ou pretende transferir apenas os seus deveres e obrigações, que não faz há quase trinta anos: demarcar a LPM de 1831, do litoral brasileiro. Isso que foi feito não é nada, a não ser mais uma embromação que gerará somente mais insegurança, um jogo de “empurra-empurra”, que não levará a caminho nenhum, só o aumento do caos em proporção geométrica. Mais uma Medida inócua e incompetente, caótica e despropositada. Fortaleza, 05 de Fevereiro de 2018.
Dr. Paulo Lamarão.
OAB-PA 1582 OAB-CE 15894-A
.
Postado por blog do Paulo Lamarão às 07:03
Commentaires